Reflexão do Evangelho da Solenidade da Bem-Aventura Virgem Maria da Conceição Aparecida
Neste dia 12 de outubro, a Igreja no Brasil encontra-se em festa, pois celebra a Solenidade de Nossa Senhora Aparecida. O Evangelho desta solenidade é o conhecido Milagre das Bodas de Caná. Acompanhemos a reflexão sobre este Evangelho.
EVANGELHO
Fazei o que ele vos disser.
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo João 2,1-11
Naquele tempo,
1 houve um casamento em Caná da Galileia.
A mãe de Jesus estava presente.
2 Também Jesus e seus discípulos
tinham sido convidados para o casamento.
3 Como o vinho veio a faltar,
a mãe de Jesus lhe disse:
"Eles não têm mais vinho".
4 Jesus respondeu-lhe:
"Mulher, por que dizes isto a mim?
Minha hora ainda não chegou."
5 Sua mãe disse aos que estavam servindo:
"Fazei o que ele vos disser".
6 Estavam seis talhas de pedra colocadas aí
para a purificação que os judeus costumam fazer.
Em cada uma delas cabiam mais ou menos cem litros.
7 Jesus disse aos que estavam servindo:
"Enchei as talhas de água".
Encheram-nas até a boca.
8 Jesus disse:
"Agora tirai e levai ao mestre-sala".
E eles levaram.
9 O mestre-sala experimentou a água,
que se tinha transformado em vinho.
Ele não sabia de onde vinha,
mas os que estavam servindo sabiam,
pois eram eles que tinham tirado a água.
10 O mestre-sala chamou então o noivo e lhe disse:
"Todo mundo serve primeiro o vinho melhor
e, quando os convidados já estão embriagados,
serve o vinho menos bom.
Mas tu guardaste o vinho melhor até agora!"
11 Este foi o início dos sinais de Jesus.
Ele o realizou em Caná da Galileia
e manifestou a sua glória,
e seus discípulos creram nele.
Palavra da Salvação.
A Semente na Terra - Jo 2,1-11
As Bodas de Caná são o primeiro sinal no Evangelho de João. Só João narra este sinal (no quarto Evangelho, os milagres são sinais). Chamam a nossa atenção os vários elementos da narração: casamento, convite, vinho, mestre-sala, servos, seis jarras de pedra, água, vinho bom... Eles têm muito a ver com a Aliança antiga e com a nova Aliança que Jesus vem inaugurar. Esta passagem tem duas interpretações. A primeira é aquela que explica o texto literalmente como está escrito e fica-se somente com os fatos relatados. Jesus foi a uma festa de casamento em uma comunidade e lá realizou o primeiro sinal, transformando a água em vinho, a pedido de sua mãe. A segunda é entrar mais profundamente nos fatos narrados, de acordo com toda a proposta do Evangelho de João.
- Houve um casamento em Caná da Galileia: o casamento era uma festa comunitária muito alegre e esperada. Durava em torno de sete dias, vinham os parentes e os amigos de longe. Ao mesmo tempo, tinha um simbolismo religioso: recordava-se a Aliança entre Deus e seu povo. Um novo casamento na comunidade era como a renovação da Aliança com Deus.
- A mãe de Jesus estava lá: no Evangelho de João, a Mãe de Jesus aparece somente duas vezes, aqui, no início, e depois, no final, aos pés da cruz (cf. Jo 19,25-27). No primeiro e no Grande Sinal, a Mãe de Jesus não foi convidada: ela já estava lá. Ela também estará lá aos pés da cruz.
- O vinho veio a faltar: o vinho era o símbolo do amor e da alegria. Um casamento sem vinho era o mesmo que um casamento sem amor. Era sinal de penúria e ou desleixo em relação aos convidados. Na medida em que as núpcias de Caná simbolizam a Antiga Aliança, a falta de vinho significa a sua imperfeição.
- Mulher, minha hora ainda não chegou: é a Mãe de Jesus quem pede e toma a iniciativa. Jesus a chama de "Mulher". Um filho nunca tratava assim a mãe. Só o marido chamava assim a esposa. Portanto, a Mãe representa a Humanidade e Jesus é o Esposo na Nova Aliança. No Antigo Testamento, Deus mesmo é o esposo (cf. Jeremias, Oseias, Isaías), o "outro pedaço" do ser humano, que ama de amor eterno (cf. Jr 31,3; Os 2,1-9; Is 54,8). Nesta linha, o Cântico dos Cânticos não só conta o amor entre o homem e a mulher, mas o amor entre Deus e o ser humano, sendo um dos cumes da revelação bíblica.
- Fazei (tudo) o que ele vos disser: a tradução correta é "fazei tudo o que ele vos disser". Deve-se fazer tudo o que Jesus dirá agora e também depois. Na Aliança do Êxodo, o povo também disse: "Faremos tudo o que o Senhor disser" (Ex 19,8; 24,7).
- Estavam lá seis talhas de pedra para a purificação dos judeus: as talhas são seis. É um número imperfeito na Bíblia. Elas estão vazias. A Lei servia para a purificação dos judeus. São os cinco Livros da Torá (Pentateuco) e a Torá Oral (Mishná) que os judeus também consideravam inspirada por Deus. Ora, era isso que se dizia da Lei: ela estava escrita em talhas de pedra e servia para a purficação dos judeus. Mas a Lei não estava mais realizando esta tarefa, foi esvaziada!
- Em cada uma delas cabiam cem litros: é preciso imaginar o esforço para encher as seis talhas contendo cada uma cem litros; ao todo são 600 litros! Eles enchem até a borda; enchem de água, símbolo da vida. Mas retiram vinho, vinho bom, símbolo do amor. O vinho novo vem em abundância. A abundância do vinho era uma característica esperada nos tempos messiânicos (cf. Gn 27,28; Is 25,6; Am 9,14). A Nova Lei será um mandamento novo: "Amai-vos uns aos outros como eu vos amei" (Jo 13,34). E em Jo 6, Jesus dará também o pão em abundância. Vinho e pão são os símbolos da Eucaristia e da Nova Aliança.
- O mestre-sala não sabia: o mestre-sala não sabe de nada, mas era ele que organizava as festas. Assim são os fariseus, ou mestres da Lei, eles não percebem que falta amor, que falta alegria no meio do povo. O mestre-sala serve vinho bom no início e depois o vinho ruim; era isso que os mestres da Lei estavam fazendo com a Lei: ela azedava a vida do povo.
- Os serventes sabiam: os serventes representam o povo, o novo povo de Deus que acolhe as palavras de Jesus. Eles logo descobrem o vinho novo, bom e em abundância.
- O noivo: o mestre-sala foi cobrar explicações do noivo. Porém, Jesus, oferecendo o vinho bom em abundância, substituiu o noivo. Ele é o esposo da Nova Aliança (cf. Jo 3,29), que oferece o vinho das núpcias messiânicas. A nova aliança é comparada a um vinho delicioso preparado por aquele que está junto à verdadeira sabedoria (e essa "preparou o seu vinho" [Pr 9,2]).
- Seus discípulos creram nele: a finalidade dos sinais que Jesus realiza é para que todos creiam nele. O verbo "crer" é fundamental no Evangelho de João, passa por todo o Evangelho.
No início do Evangelho de João aparecem duas narrações surpreendentes do ponto de vista religioso tradicional: a abundância de 600 litros de vinho numa festa de casamento e, logo em seguida, Jesus se rebelando contra a casa de Deus, o Templo! (cf. Jo 2,13-22). A Nova Aliança exige um Novo Templo, novo lugar de encontro com Deus. Estes sinais nos remetem ao último - que tem tudo a ver com o primeiro - lá na cruz (em ambos está a Mãe de Jesus), quando Ele nos amou até o fim (cf. 13,1ss), deu-nos o seu Espírito (cf. 19,30) e tornou-se fonte de sangue e água (cf. 19,34). O casamento de Caná (estranhemos ou não) já aponta para a cruz, onde finalmente se celebra o casamento entre Deus e a humanidade! Na Festa de Nossa Senhora Aparecida, o sinal aponta à realidade do povo negro - pobre e explorado historicamente - que possui a confiança na Mãe Negra de Aparecida e no Seu Filho Jesus.
Autoria: Padre Antonio José de Almeida (O Pão Nosso de Cada Dia).
Fonte: O Pão Nosso de Cada Dia. Subsídio Litúrgico Catequético Diário. Ano XIX, nr. 226 - Outubro 2024 (Seção A Semente na Terra), pp. 48-49.
Crédito da imagem: Oratório São Luiz.
Ano B, Liturgia da Palavra, reflexões, Solenidade, Nossa Senhora Aparecida, Evangelho de São João, Bodas de Caná
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