O Reino de Deus
Quando falamos de Escatologia, uma disciplina presente na Teologia, podemos verificar um número expressivo de categorias presentes nesta disciplina. Dentre as diversas categorias da Escatologia, e também um termo bastante encontrado nas Sagradas Escrituras, está a categoria Reino de Deus. Neste artigo, o Cardeal Gianfranco Ravasi faz uma sintética explanação sobre este tema.
Vamos estudar uma palavra muito importante no Novo Testamento: basileia, "reino", presente 162 vezes, à qual se associa espontaneamente basileus, "reis", citada 155 vezes, a partir da menção do rei Davi, que aparece na genealogia de Jesus (cf. Mt 1,6). Quando o próprio Jesus dá início ao seu ministério público na Galileia, as primeiras palavras que pronuncia são: "Cumpriu-se o tempo, e está próximo o Reino de Deus. Convertei-vos e crede no Evangelho" (Mc 1,15); "Convertei-vos, porque o Reino de Deus está próximo" (Mt 4,17). Ecoa nas palavras de Jesus a mesma pronunciada pelo Precursos, João Batista (cf. Mt 3,2).
O centro do anúncio cristão rodará justamente em torno deste símbolo que já tinha sido adotado no Antigo Testamento no seu duplo significado: significado ativo de "governo e senhorio divino", e significado passivo de povo (ou da terra) governada com justiça pelo Senhor. Naturalmente, a imagem tinha sido tirada das civilizações do antigo Oriente Próximo e da própria experiência de Israel, que tinha escolhido o sistema monárquico por volta do século XI a.C. Aliás, a dinastia davídica tinha sido considerada como caminho histórico para o messianismo.
Ora, o "conceito de Reino de Deus" ("reino dos céus" é uma forma cara a Mateus para evitar, segundo o estilo judaico, o uso do nome divino, sagrado e impronunciável) quer indicar sobretudo o projeto de uma sociedade justa, de uma criação harmônica, concebida e querida por Deus. Um projeto infelizmente prejudicado e devastado pelo pecado humano. Os Salmos que cantam o Reino de Deus (47; 93; 96-99) exaltam a intervenção do Senhor/Rei oara dar origem àquele "reino de verdade e de vida, de santidade e de graça, de justiça, de amor e de paz", que é justamente celebrado não só como esperança, mas também como presença na história através do anúncio evangélico.
Sim, porque Jesus não só proclama a inauguração do reino de Deus nas suas parábolas e na sua obra salvífica, mas ele próprio é definido como rei na grandiosa cena do juízo final, esboçada e descrita por Mateus: "Quando o Filho do homem vier na sua glória com todos os seus anjos, sentar-se-á sobre o trono da sua glória. Então, o rei dirá aos que estiverem à sua direita [...]" (Mt 25,31.34). Ele é o basileus grego, o soberano que exerce o mesmo papel que era de Deus no Antigo Testamento: "O Senhor vem para julgar a terra; julgará o mundo com justiça com verdade todos os povos [...] porque justiça e direito são a base do seu trono" (Sl 96,13; 97,2; 98,9).
Quanto o seu governo seja diferente do governo dos soberanos deste mundo, Jesus o declara explicitamente ao representante do poder imperial romano, o procurador Pôncio Pilatos, numa página extraordinária do Evangelho de João: "O meu reino não é deste mundo [...] Eu sou rei [...] para dar testemunho da verdade" (Jo 18,33-37). Por isso, o mesmo evangelista João apresentará uma dúzia de vezes o tema da realeza de Cristo, durante a sua Paixão, transformando a cruz no trono da glória do Crucificado.
Cristo é, portanto, um rei que não se comporta como "os reis das nações que dominam e se fazem chamar benfeitores" (Lc 22,25). "O Filho do homem, de fato, não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate de todos" (Mc 10,45). Ele se sacrifica e se faz circundar não pelos poderosos, mas pelos últimos da terra, compartilhando sua sorte. É este o reino de Deus, semelhante a "um grãozinho de mostarda [...] a menor de todas as sementes, ou então ao fermento amassado com a farinha" (Mt 13,31-33) da história humana. Escondido, mas eficaz, encoberto nas camadas da terra, ams fecundo. É este o reino de Deus que invocamos na oração do Pai-Nosso: "Venha a nós o vosso reino!". E é este o anúncio que é repetido em nome de Cristo pelos seus discípulos: "Por onde andares, proclamai: 'O Reino de Deus está próximo'!" (Mt 10,7).
Cardeal Gianfranco Ravasi*.
* Cardeal italiano, presidente emérito para o Pontifício Conselho para a Cultura e presidente da Pontifícia Comissão de Arqueologia Sacra.
Crédito da imagem: Pastor Bonus.
Crédito da foto do Cardeal Ravasi: Citações e Frases Famosas.
Formações, escatologia, teologia dogmática
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