Heresias e Correntes Filosóficas ao Longo da História
Desde antes a encarnação do Senhor até a morte do último apóstolo, São João, por volta do ano 100 d.C., diversas correntes filosóficas e heresias apareceram ao longo da história da Igreja. Os primeiros concílios da Igreja se debateram contra diversos pensamentos e doutrinas, muitos dos quais chegaram, por diversas vezes, abalar a unidade da Igreja. Elencaremos, neste artigo, os principais pensamentos e doutrinas filosóficas dos quais a Igreja se debateu ao longo de sua caminhada.
CETICISMO
Segundo essa doutrina filosófica, a atitude fundamental do ser humano na busca da verdade está na dúvida. Para um cético, não é possível nenhuma posição absolutamente certa e definitiva em relação à verdade, muito menos esta. Surgiu na Grécia, no período helenístico, no final do século IV a.C., através do pensamento de Pirro de Élida (365-275 a.C.).
DONATISMO
Foi uma heresia muito difundida no norte da África (a África latina) nos séculos IV e V, a partir das atitudes e da pregação do bispo Donato, bispo da Namíbia. Donato recusava a jurisdição do bispo de Cartago, que ele considerava ser um apóstata pelo fato de ter entregue às autoridades romanas (na época da perseguição de Deocleciano entre os anos 303-312) livros e objetos de culto. Ensinava que a validade de um sacramento depende da santidade do ministro: "ninguém dá o que não tem". O donatismo foi combatido ferrenhamente por Santo Agostinho e foi condenado pelo I Concílio de Arles, em 314.
ARIANISMO
Surgiu no século IV d.C. e se desenvolveu na Alta Idade Média. A doutrina ariana negava a divindade de Cristo e a consubstancialidade entre Jesus e Deus Pai. O arianismo foi fundado por Ário, um presbítero cristão de Alexandria, no Egito. Ário defendia que Cristo foi criado por Deus, assim como todas as outras criaturas, e não partilhava da mesma substância de Deus.
O arianismo foi propagado em diversas tribos germânicas do mundo europeu, mesmo sendo visto como uma heresia.
O Concílio de Niceia, em 325, foi uma das reuniões mais importantes do cristianismo e que abordou a natureza de Cristo. Os participantes concluíram que Jesus Cristo era composto da mesma substância de Deus e não poderia ser julgado como uma criatura mortal.
MANIQUEÍSMO
Sistema filosófico e religioso iniciado pelo persa Manes, no século III. O bem e o mal são concebidos como princípios reais, estruturalmente iguais e antagônicos. A matéria é radicalmente má e se opõe ao espírito, que é bom por princípio. A matéria está na origem de todas as misérias e é o cativeiro das almas. Santo Agostinho foi maniqueu por nove anos. O maniqueísmo é incompatível com a fé judaico-cristã.
MATERIALISMO
Princípio e sistema filosófico conforme os quais a realidade se reduz à matéria, não concebendo a existência de nenhuma realidade e nenhum princípio superior a ela, muito menos espiritual ou transcendente. É uma corrente filosófica iniciada na Antiguidade, sendo retomada durante o período do Renascimento, que iniciou-se no século XIV e se estendeu até o século XVII.
NATURALISMO
São atitudes ou interpretações da existência, sejam de formas prática e/ou teóricas, conforme às quais o real coincide com o "natural", ou seja, com a experiência óbvia de todos os dias. Para essa corrente, não há espaço para a metafísica nem para qualquer religião revelada, muito menos para uma ética que vá para além das regras de bom senso para a vida prática.
NESTORIANISMO
Afirmava que, em Cristo, havia dois sujeitos: um humano e outro divino, negando a dualidade de natureza humana e divina em Cristo. Foi criada por Nestório (380-451), monge de Antioquia, e que foi Patriarca de Constantinopla entre 428 a 431. Sua doutrina baseava-se sob os estudos de Nestório em Teodoro de Mopsuéstia, e enfatizava a desunião entre as naturezas humana e divina de Cristo.
Essa doutrina foi condenada pelo I Concílio de Éfeso, em 431.
PELAGIANISMO
Heresia amplamente difundida no século IV, procurava minimizar, em outros momentos até mesmo anular, o papel da graça na salvação. Nasceu do pensamento do monge bretão Pelágio (360-422), que defendia que a liberdade humana não ficou prejudicada pelo pecado original. O ser humano tem a capacidade de escolher entre o bem o mal, por suas próprias e exclusivas forças. O ser humano é merecedor, por si só, da salvação. Santo Agostinho também combateu com força essa heresia, que foi condenada pelo Concílio de Cartago, em 411, e pelo Concílio de Éfeso (418-431).
O pelagianismo foi condenado pelo Concílio de Orange (441), que condenou as ideias desta doutrina e declarou, de forma negativa, a total incapacidade do ser humano em realizar qualquer coisa por suas próprias forças para alcançar a salvação e, de forma positiva, a absoluta necessidade da graça para que o ser humano possa realizar qualquer ação em relação à fé e à salvação.
MONOFISISMO
Doutrina desenvolvida por Êutiques, monge arquimandrita em Constantinopla e um tanto limitado intelectualmente.
Ao defender a cristologia ortodoxa de São Cirilo de Alexandria - que dizia que, no Homem-Deus, só existe uma pessoa: a do Verbo Encarnado, mas com dois princípios de ação (o humano e o divino) que são perfeitamente distintos na unidade da mesma pessoa -, Êutiques abusou de certas expressões do grande teólogo de Alexandria.
Com receio de cair no nestorianismo, acabou negando a dualidade de naturezas, a humana e a divina, em Cristo.
Para Êutiques, a existência, em Cristo, era de uma única natureza: "mónos", em grego significa um; e "phýsis", que significa natureza, que, para ele, era a divina. Nesta "natureza única" (divina), a humanidade é absorvida pela divindade e como se fosse "uma gota de mel no oceano".
Esse pensamento teve bastante força pelo ano 448, sendo condenado pelo Concílio de Calcedônia, em 451.
Mesmo tendo sido condenado pelo Concílio de Calcedônia, o "monofisismo" ainda aparece e algumas Igrejas orientais monofisistas, com a Igreja na Síria, na Armênia e, sobretudo, na Etiópia.
Crédito das imagens: Pintura do I Concílio de Niceia (325); Pirro de Élis: Medium.
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